domingo, 13 de novembro de 2016

“A dívida pública

“A dívida pública é um mega esquema de corrupção institucionalizado”

Para ex-auditora da Receita, convidada pelo Syriza para analisar a dívida grega, sistema atual provoca desvio de recursos públicos para o mercado financeiro.

por Renan Truffi — publicado 09/06/2015 04h34, última modificação 09/06/2015 17h32
 Entrevista - Maria Lucia Fattorelli
Nilson Bastian / Câmara dos Deputados
Maria Lucia Fattorelli já auditou a dívida pública do Equador e agora faz o mesmo pela Grécia.
Dois meses antes de o governo Dilma Rousseff anunciar oficialmente corte de 70 bilhões de reais do Orçamento por conta do ajuste fiscal, uma brasileira foi convidada pelo Syriza, partido grego de esquerda que venceu as últimas eleições,para compor o Comitê pela Auditoria da Dívida Grega com outros 30 especialistas internacionais. A brasileira em questão é Maria Lucia Fattorelli, auditora aposentada da Receita Federal e fundadora do movimento “Auditoria Cidadã da Dívida” no Brasil. Mas o que o ajuste tem a ver com a recuperação da economia na Grécia? Tudo, diz Fattorelli. “A dívida pública é a espinha dorsal”.
Enquanto o Brasil caminha em direção à austeridade, a estudiosa participa da comissão que vai investigar os acordos, esquemas e fraudes na dívida pública que levaram a Grécia, segundo o Syriza, à crise econômica e social. “Existe um ‘sistema da dívida’. É a utilização desse instrumento [dívida pública] como veículo para desviar recursos públicos em direção ao sistema financeiro”, complementa Fattorelli.
Esta não é a primeira vez que a auditora é acionada para esse tipo de missão. Em 2007, Fattorelli foi convidada pelo presidente do Equador, Rafael Correa, para ajudar na identificação e comprovação de diversas ilegalidades na dívida do país. O trabalho reduziu em 70% o estoque da dívida pública equatoriana.

Em entrevista a CartaCapital, direto da Grécia, Fattorelli falou sobre como o “esquema”, controlado por bancos e grandes empresas, também se repete no pagamento dos juros da dívida brasileira, atualmente em 334,6 bilhões de reais, e provoca a necessidade do tal ajuste.
CartaCapital: O que é a dívida pública?

Maria Lucia Fattorelli: A dívida pública, de forma técnica, como aprendemos nos livros de Economia, é uma forma de complementar o financiamento do Estado. Em princípio, não há nada errado no fato de um país, de um estado ou de um município se endividar, porque o que está acima de tudo é o atendimento do interesse público. Se o Estado não arrecada o suficiente, em princípio, ele poderia se endividar para o ingresso de recursos para financiar todo o conjunto de obrigações que o Estado tem. Teoricamente, a dívida é isso. É para complementar os recursos necessários para o Estado cumprir com as suas obrigações. Isso em principio.

 CC: E onde começa o problema? 
MLF: O problema começa quando nós começamos a auditar a dívida e não encontramos contrapartida real. Que dívida é essa que não para de crescer e que leva quase a metade do Orçamento? Qual é a contrapartida dessa dívida? Onde é aplicado esse dinheiro? E esse é o problema. Depois de várias investigações, no Brasil, tanto em âmbito federal, como estadual e municipal, em vários países latino-americanos e agora em países europeus, nós determinamos que existe um sistema da dívida. O que é isso? É a utilização desse instrumento, que deveria ser para complementar os recursos em benefício de todos, como o veículo para desviar recursos públicos em direção ao sistema financeiro. Esse é o esquema que identificamos onde quer que a gente investigue.

CC: E quem, normalmente, são os beneficiados por esse esquema? Em 2014, por exemplo, os juros da dívida subiram de 251,1 bilhões de reais para 334,6 bilhões de reais no Brasil. Para onde está indo esse dinheiro de fato?
MLF: Nós sabemos quem compra esses títulos da dívida porque essa compra direta é feita por meio dos leilões. O processo é o seguinte: o Tesouro Nacional lança os títulos da dívida pública e o Banco Central vende. Como o Banco Central vende? Ele anuncia um leilão e só podem participar desse leilão 12 instituições credenciadas. São os chamados dealers. A lista dos dealers nós temos. São os maiores bancos do mundo. De seis em seis meses, às vezes, essa lista muda. Mas sempre os maiores estão lá: Citibank, Itaú, HSBC...é por isso que a gente fala que, hoje em dia, falar em dívida externa e interna não faz nem mais sentido. Os bancos estrangeiros estão aí comprando diretamente da boca do caixa. Nós sabemos quem compra e, muito provavelmente, eles são os credores porque não tem nenhuma aplicação do mundo que pague mais do que os títulos da dívida brasileira. É a aplicação mais rentável do mundo. E só eles compram diretamente. Então, muito provavelmente, eles são os credores.

CC: Por quê provavelmente?
MLF: Por que nem mesmo na CPI da Dívida Pública, entre 2009 e 2010, e olha que a CPI tem poder de intimação judicial, o Banco Central informou quem são os detentores da dívida brasileira. Eles chegaram a responder que não sabiam porque esses títulos são vendidos nos leilões. O que a gente sabe que é mentira. Porque, se eles não sabem quem são os detentores dos títulos, para quem eles estão pagando os juros? Claro que eles sabem. Se você tem uma dívida e não sabe quem é o credor, para quem você vai pagar? Em outro momento chegaram a falar que essa informação era sigilosa. Seria uma questão de sigilo bancário. O que é uma mentira também. A dívida é pública, a sociedade é que está pagando. O salário do servidor público não está na internet? Por que os detentores da dívida não estão? Nós temos que criar uma campanha nacional para saber quem é que está levando vantagem em cima do Brasil e provocando tudo isso.
(...) Cont.
 Transcrito da Carta Capital
PROPOSTA
Cidadão pagaria R$ 3 bilhões
Deputado Marcus Pestana quer que imposto de renda banque sozinho partidos e campanhas no país
Deputado Marcus Pestana (PSDB) -  reconhece que seu projeto é polêmico.

PUBLICADO EM 13/11/16 - 03h00 Jornal O Tempo
BERNARDO MIRANDA
TÂMARA TEIXEIRA
Com partidos e campanhas vivendo o impacto da crise econômica e da proibição das doações de empresas, o deputado federal Marcus Pestana (PSDB) encontrou a saída no bolso do contribuinte. O parlamentar mineiro apresentou à Câmara um projeto parar criar o Fundo Especial de Financiamento da Democracia (FFD), com R$ 3 bilhões anuais, exclusivamente com dinheiro público, proveniente do pagamento de impostos.
A novidade – um dos pontos da reforma política em debate – substituiria o atual Fundo Partidário e seria responsável por bancar todas as campanhas do país, além de custear as despesas de manutenção dos partidos. A doação de pessoas físicas, por exemplo, ficaria proibida. O PL 6.368/2016 prevê que a União desembolse R$ 3 bilhões ao ano, valor 300% superior aos R$ 737 milhões que serão destinados às siglas neste ano. (...)

População rejeita texto
Uma enquete no portal O TEMPO revela que a proposta de R$ 3 bilhões para partidos não conta com o apoio popular. Entre os 2.477 internautas que participaram, a grande maioria, 79%, é contra financiamento público de campanhas. Outros 16% são favoráveis ao financiamento público, mas discordam do valor, e 5% são a favor do fundo. (TT/BM)

ENQUETE
5% dos internautas apoiam o projeto de Marcus Pestana.
16% dos internautas defendem o fundo, mas vetam o valor.
79% dos internautas se dizem contrários à proposta tucana.

A FAVOR
“Democracia implica em eleição, partido e candidato. Tem custo e três fontes possíveis: empresas, pessoas ou algum fundo público. De empresas, depois da Lava Jato, até o caixa 1 foi criminalizado. De pessoas, não há tradição. Aqui virou o paraíso dos milionários. Propus um fundo público, com 2% do imposto de renda. Não há aumento de carga tributária.” Marcus Pestana (PSDB), deputado federal.

CONTRA
“Essa proposta é uma das coisas mais indecentes que eu já vi. No cenário de contenção de gastos, é absurdo propor financiar partidos com R$ 3 bilhões por ano. As campanhas sempre foram custeadas com dinheiro público, mediante pagamento de propina, e os partidos se tornaram empresas.” Antônio Flávio Testa, cientista político
Ver matéria na íntegra : Jornal O Tempo.

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