Odebrecht diz que é o
otário do governo. Bobagem. Otários somos nós.
Leonardo Sakamoto 02/03/2017
''Eu era o otário do governo. Era o bobo da corte do governo.'' A resposta de Marcelo Odebrecht dada a Herman Benjamin,
relator da ação no Tribunal Superior Eleitoral que investiga a chapa Dilma
Rousseff e Michel Temer nas eleições de 2014, tenta despistar
uma verdade. Ele pode não dar ordens ao governo, como questionado, ou ''não ser
dono do governo'', como mesmo disse. Mas faz parte do grupo que dá ordens e que
é dono."
"Esse grupo se espalha por diferentes setores econômicos e regiões do
país. Ajuda a eleger e a derrubar presidentes. Faz de magistrados heróis para
depois os transformarem em vilões, sempre de acordo com suas conveniências.
Manipula a edição de debates eleitorais e infla patos de borracha na TV,
trancando avenidas e prendendo atenções do público para a sua causa. Financia
(e, se tudo correr como querem, voltará a financiar) campanhas de adversários
com o mesmo montante de recursos para que, independentemente de quem vença,
eles sejam os reais ganhadores."
"Esse grupo não tem um líder específico, não possui bandeira ou estatuto,
não possui religião, não conta com sede própria ou endereço para
correspondência. Ninguém é convidado a fazer parte dele, mas os que dele
fazem parte sabem bem onde estão e o que devem defender para a sobrevivência de
seu grupo."
"O clã Odebrecht pode cair, entre outros. Mas esse grupo continuará
reinando. Neste momento, por exemplo, ele empurra goela abaixo da sociedade uma
Reforma da Previdência que fará com que os trabalhadores de regiões mais
pobres, com menor expectativa de vida e que começaram a trabalhar mais cedo,
morram antes de se aposentar. E uma Reforma Trabalhista que pode levar ao
aumento de jornadas sem o pagamento das devidas horas extras. Ou mesmo a
redução da proteção do trabalhador através da ampliação da terceirização legal
para todas as atividades de uma empresa, como proposto no PL 4302/1998, já
aprovado no Senado Federal e que, agora ressuscitado, será apreciado pela Câmara
dos Deputados."
"A histórica incompetência, leniência ou má fé do poder público (do PSDB,
passando pelo PT até chegar ao PMDB) quanto ao setor de construção civil tem
comprometido a dignidade de trabalhadores na construção de casas, apartamentos
e centros empresariais. "(...)
Blog do Sakamoto
Leonardo Sakamoto
É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São
Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e o desrespeito aos direitos
humanos no Brasil. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante
do Departamento de Política da New School,
em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É
diretor da ONG Repórter Brasil e conselheiro do Fundo das Nações Unidas para
Formas Contemporâneas de Escravidão.
São muitos os bobos da corte.
02/03/2017
Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper
“Em depoimento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o
ex-presidente do Grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht, teria afirmado ser “o bobo
da corte do governo federal”, o “otário do governo”. É evidente que não se pode
falar que Odebrecht foi simplesmente usado, nem sua reconhecida inteligência
lhe permitiria passar por inocente. Ainda assim, está claro que o empresário se
refere a um jogo marcado desde tempos imemoriais, no Brasil. Jogo do qual,
agora, se arrepende ter praticado.”
“Trata-se de um esporte de regras bastante rígidas; impõe um
postulado básico: quem não está dentro do esquema está fora do governo e de
seus negócios. Este jogo se reproduz Brasil afora – e em vários outros países
também. Está na União, nos estados e nos municípios; em todos os escalões,
passa por milhares de agentes: dos políticos com mandatos, aos nomeados; está
nas assessorias e nos quadros de carreira. Em muitos casos, é condição sine qua
non para ascensão social e elevação nas carreiras.” (...)
Blog do Carlos Melo.
Carlos Melo: paulistano, filho de açorianos,
nasceu em 1965. Cientista político, com graduação, mestrado e doutorado na
PUC-SP. Professor de tempo integral do Insper desde 1999; colecionou
experiências, conquistou prêmios de ensino. Analista político, com colaboração
em vários meios de comunicação; palestrante e consultor. Autor de "Collor,
o ator e suas circunstâncias".
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